Declaração e Compromisso Fé no Clima
Lideranças religiosas do Brasil e do exterior acabam de lançaram em 2015 a Declaração e Compromisso Fé no Clima. O documento, assinado por representantes de 12 religiões, sintetiza as percepções e aspirações comuns a todos, as quais incluem o chamado para que a sociedade, por intermédio também das suas comunidades religiosas, envolva-se assertivamente na discussão sobre as mudanças climáticas, e uma agenda básica para que o governo assuma metas ambiciosas na Conferência do Clima (COP 21), que ocorrerá em Paris em dezembro de 2015.
Comunidades Religiosas e Mudanças Climáticas
Introdução
· Reunidos a convite do Instituto de Estudos da Religião (ISER), em parceria com Gestão de Interesse Público (GIP), no Encontro Internacional Fé no Clima,
ocorrido em 25 de agosto de 2015 no Rio de Janeiro, enquanto
representantes de diversas comunidades religiosas regionais, nacionais,
internacionais e transnacionais, vimos compartilhar nossas convergências
de percepções e aspirações em torno do tema das mudanças climáticas.
· Consideramos
que essas percepções e aspirações, na medida em que sejam conhecidas e
disseminadas no interior das nossas comunidades religiosas, contribuirão
de maneira substantiva para promover na esfera local mudanças
comportamentais e éticas — individuais e coletivas —, que se somarão aos
compromissos sociais, econômicos e políticos a serem assumidos pelos
governos em suas esferas regionais, nacionais e nos fóruns
internacionais
· O
debate sobre as mudanças climáticas não pode se dar descontextualizado
das questões sociais, econômicas e ambientais. O risco que se corre com
isso é o de que este importante desafio de lidar com a mudança do clima
se torne apenas mais uma “bandeira”, sem uma reflexão mais profunda
sobre seus impactos no aprofundamento das desigualdades e na geração de
disputas de política econômica global. Esse debate deve ser apreciado à
luz da justiça social, das questões ambientais mais amplas e da busca de
equidade econômica.
· O grupo de lideranças comunitárias e religiosas, comprometido com a agenda ambiental, reunido na iniciativa Fé no Clima
espera dar um testemunho vivo da possibilidade de comunhão de
percepções, aspirações e ações concretas para a construção de um mundo
mais saudável e respeitoso, mesmo em face da mais ampla diversidade de
crenças e pertenças e inclusive de não crenças.
Percepções comungadas
· A
Ciência vem demonstrando que o estado de dilapidação do planeta Terra e
o agravamento das mudanças climáticas foram provocados pela ação humana
recente (Antropoceno). O conjunto de ações que conduziram o planeta à
situação presente foi baseado em uma mentalidade dominante que
acreditava e agia como se o ser humano fosse algo isolado das complexas
relações que possibilitam a vida. Nossos fundamentos sagrados, no
entanto, encontram uma forte convergência na percepção de que o ser
humano é tão importante no planeta Terra (Mamapacha, Irê, Casa Comum)
quanto os outros entes animados e não animados que aqui vivem. A interdependência entre todos os seres é a consciência que devemos promover em nossas comunidades, se quisermos propiciar uma transformação ética e comportamental sistemática e planetária.
· Consideramos
que enquanto a lógica da competição dominar a vida humana em sociedade e
prevalecer na base das razões dos Estados e nos campos de negociação da
diplomacia global, pouco ou nenhum avanço conseguiremos no sentido de
tornar a vida planetária mais justa e segura. Baseados em nossos
fundamentos sagrados comungamos a ideia de que o espírito de colaboração
e cooperação pavimentam o caminho de uma vida em sociedade mais
saudável e digna para todos e cada um dos nós, em harmonia com o
ambiente e nossas diferenças intrínsecas. O espírito de colaboração e responsabilidade compartilhada é o que devemos promover em nossas comunidades,
se quisermos propiciar a sustentabilidade da comunidade e do planeta,
onde cada pessoa conhece e defende os seus direitos, aceita e se
compromete com as suas responsabilidades.
· Entendemos
que para a mobilização das nossas comunidades em torno do tema das
mudanças climáticas devamos nos aproximar da Ciência e dos Saberes
Tradicionais com igualdade de respeito e valoração. Cada uma destas
formas de produção de conhecimento, à sua maneira, nos oferece
evidências do estado atual do planeta e os horizontes possíveis para
ações transformadoras. Nossas experiências com ações sociais e
educativas desenvolvidas em nossas comunidades demonstram que percepções
e conceitos são melhor compreendidos e assimilados quando apresentados a
partir de experiências vividas. Assumimos o compromisso de
expressar as discussões sobre mudanças climáticas em uma linguagem que
faça sentido para nossas comunidades e que nos permita refletir sobre
como podemos transformar nossos modos de vida, promovendo sensibilização e mobilização efetiva sobre o tema.
· Consideramos
a juventude o grande ator potencial da transformação de que
necessitamos. As gerações passadas, incluindo-se a nossa, agiram
equivocada e inconsequentemente, e disto estamos conscientes. Os jovens
das nossas comunidades são os principais agentes da transformação
desejada e aqueles que construirão — assim o esperamos — um planeta mais
saudável para acolher os sonhos e as aspirações humanas. Devemos
agir imediatamente, veiculando esta mensagem de confiança na juventude e
em sua capacidade de transformação de uma forma abrangente e eficaz,
utilizando todos os meios de comunicação ao nosso alcance e uma
linguagem positiva, se desejarmos que as chances de um futuro saudável e
seguro estejam garantidas para as gerações atuais e futuras.
Aspirações compartilhadas
· Sem
negar nossa preocupação com as tristes perspectivas que se apresentam
sobre o futuro da vida humana no planeta Terra, acreditamos na potência
transformadora que reside na comunhão de aspirações das diversas
comunidades religiosas do mundo. Congregados na intenção de transformar o
paradigma de desenvolvimento vigente, pautado equivocadamente na visão
de que a proteção ao meio ambiente é um obstáculo ao crescimento
econômico e à promoção do bem-estar de nossas sociedades — e sua
correlata mentalidade predadora — desejamos contribuir com a promoção de
importantes transformações éticas e comportamentais — individuais e
coletivas — na direção de uma Criação que reflita esforços de cuidado,
conexão espiritual e justiça social, econômica e ambiental.
· Entendemos
como fundamental que a sociedade, por intermédio também das suas
comunidades religiosas, envolva-se assertivamente na discussão sobre as
mudanças climáticas, a responsabilidade que temos sobre elas e o que
podemos fazer, individual e coletivamente, para mudar nosso estilo de
vida, interagindo com seus governos e instituições especializadas no
processo de construção de uma agenda global de enfrentamento da crise
climática, anunciadas pela Ciência e que só vem agravando, decorrentes
das ações humanas predatórias.
· Convocamos
as comunidades religiosas a demandarem que seus governos nacionais
assumam metas ambiciosas na Conferência do Clima (COP 21), que ocorrerá
em Paris em dezembro de 2015, para promover: 1) a redução substancial
das emissões de gases com efeito de estufa compatível com a necessidade
de limitar o aumento da temperatura global a 2 graus Celsius até 2100;
2) a preservação da biodiversidade em todos os biomas; 3) o controle do
desmatamento; 4) ações de adaptação em benefício das populações mais
vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas; 5) a garantia de
preservação de tradições culturais e modos de vida; 6) o combate à fome e
à indignidade, e 7) a adoção preferencial de fontes de energia
renováveis e de tecnologias limpas.
· Que
a presente declaração seja nosso compromisso coletivo para um clima
ambiental e relacional mais saudável entre todos os seres da Terra.
Rio de Janeiro, 25 de agosto de 2015.
André Trigueiro
Pastor Ariovaldo Ramos
Mãe Beata de Yemonjá
Dolores (Inkaruna) Ayay Chilón
Mãe Flávia Pinto
Reverendo Fletcher Harper
Padre Josafá Carlos de Siqueira SJ
Baba Kola Abimbola
Léo Yawabane
Lama Padma Samten
Rabino Nilton Bonder
Pastor Timóteo Carriker
Comentários